O Senhor Adelino esteve na Guerra do Ultramar e contou-me algumas coisas que se passaram lá.
O senhor Adelino recebeu a carta de aviso, 10 dias antes da partida. Deixou uma mulher com duas filhas, uma com 15 dias e outra com um ano.Apanhou o barco, no cais de Lisboa, a 6 de Julho de 1973, às 11:30 horas, junto de outras 1600 pessoas em cada batalhão e eram 2 batalhões. Levaram 5 dias até á Madeira, onde fizeram escala, para embarcar outra companhia de cerca de 250 homens. Estiveram 2 horas, na Madeira, para a companhia entrar no barco e partiram para a Guiné. Demoraram 8 dias a chegar. No barco, a alimentação não podia ser coisas que se entornassem. Dia sim, dia não, havia pesca, para que os tripulantes se alimentassem, porque quase nunca era carne.No segundo dia de viagem, no barco, tiveram uma instrução de salva-vidas. Ensinaram a pôr o salva-vidas e a salvarem-se se o barco avariasse ou se afundasse.Os que iam no primeiro andar eram os oficiais e os comandantes e, no segundo, eram os furriéis, os segundos sargentos, que eram os que estavam no escritório, e os segundos cabos. No terceiro andar, era onde estava o refeitório e as camas dos tropas. Os dormitórios eram do tamanho do barco e dormiam 3 ou 4 pessoas em camas umas em cima das outras.Durante o dia, descansavam e iam para a varanda do barco a ver o mar e os homens de madrugada a pescarem peixe.Quando chegaram à Guiné, ao avistar terra, atracaram afastados da costa, saíram do barco e foram até terra, por um LDG (barco de guerra). Quando chegaram a terra, foram distribuídos por destacamento e cada destacamento tinha a sua especialidade. O do senhor Adelino era de condutor de carros da tropa. Foram distribuídos por aldeias e vilas. Em Bolama, nos primeiros dias, antes de ir para os estágios, quando estavam a comer, foram atingidos de surpresa pelos “terroristas” com mísseis, em que morreu a primeira vítima. Dormiam em tendas, 4 ou 5 pessoas na mesma tenda, dependia do tamanho da tenda. Quando não estavam em operação e às vezes quando estavam, dormiam em minas (abrigo debaixo do chão) e cabiam 12 pessoas em cada abrigo. Eram 10 abrigos em cada destacamento.Só havia 1 refeição de peixe por semana, quando não estavam em operações.Quando iam para a operação, tinham meia hora para comerem e para tomarem 3 comprimidos com o vinho, para não terem medo da guerra, meia hora para se equiparem e 15 minutos para formar.Saiu de lá, depois de ter guardado os portugueses, na Guiné, depois do 25 de Abril, no dia 7 de Setembro de 1974, num avião 707, até Lisboa.À noite, num papel, escrevia as operações que teve ou tentativas de operações:«Setembro, um ataque à aldeia Formosa7/9/1974 – Ataque a Cobejá, 1 mortoPatrulhamento, um mortoBolama, um morto e 2 feridos16/12/1973 - Operação à mata pronto a matar27/12/1973 – Coluna a fasiu ataque15/1/1974 – Coluna Cojá – 9:23 horas31/1/1974 – Um carro Fiat foi deitado a baixo pelos turros (inimigo)24/2/1974 – ataque conqualifá – 16:00 horas05/3/1974 – ataque conqualifá – 6:00 horas18/3/1974 – ataque conqualifá – 2:30 horas19/3/1974 – ataque conqualifá – 5:00 horas20/3/1974 – ataque conqualifá – 2:25 horas21/3/1974 – ataque congualifá – 14:00 horas24/3/1974 – ataque conqualifá – 12:00 horas31/3/1974 – ataque conqualifá – 5:15 horas29/4/1974 – Revolução em Bissau com população12/5/1974 – Guiné era para ser invadida com 300.000 turras (inimigos), pelo mar, terra e ar. Gritavam “Viva o Spínola”.»
Ana Patrícia